"Espalhados entre a comunicação social, o show business e a diplomacia"
Luanda - É facto indesmentível que o deposto General criou uma interessante “net work” doméstica, cujo estatuto se desconhece, que envolveu conhecidas figuras da comunicação social e do show business, num projecto abrangente, que ultrapassava o que parecia ser evidente.
E ultrapassava porque foi o próprio Miala quem se referiu especificamente aos jornalistas como sendo um “target” da sua instituição em termos de recrutamento. Estas pessoas a certa altura da sua trajectória profissional e pessoal passaram a ter o que a linguagem comum designa por “costas quentes”.
Mais ou menos quentes, de acordo com a sua colocação hierárquica na já referida “net work”, que se repercutia no seu desempenho profissional e no seu relacionamento pessoal e institucional.
Nos seus locais de trabalho eles passaram a ser vistos com outros olhos mais receosos por parte de quem, incluindo os seus próprios chefes, partia do princípio que eles estariam imbuídos de uma espécie de poder paralelo. Um poder que lhes era transmitido pela intimidade que partilhavam com o General no seu labirinto.
Estas pessoas estão agora confrontadas com o drama do “day after”, após o afastamento do seu patrono da cena de um país que vive de ciclos, de sobressaltos, de tráficos de influência e de intrigas palacianas. O impacto imediato desta alteração vai sentir-se na forma como os olhares receosos de um passado recente deverão ceder lugar a olhares mais tranquilos e menos subservientes.
As “costas quentes” já terão, entretanto, arrefecido. Bruscamente, ao que se sabe. Depois restará esperar pelo destino que o Projecto Criança Futuro vai conhecer, de agora em diante, sem o apoio do seu fundador e patrocinador.
Desde logo fica claro que não vai ser fácil manter de pé um Projecto, que o General definiu como sendo uma ponte para se manter perto da sociedade.“Não é possível garantir a segurança de um Estado e, por conseguinte, de uma sociedade, estando longe dela, precisamente porque cultivamos o princípio de que a nossa actividade é para o benefício da sociedade e nunca contra ela. Sou um cidadão com responsabilidades, mas sou acima de tudo um ser humano”.
Assim Garcia Miala definiu a sua estratégia para além dos muros do Serviço de Inteligência Externa (SIE), na entrevista que concedeu ao Jornal de Angola em finais de 2002. Miala ter-se-á esquecido, certamente, da exclusividade a que está obrigado por lei o próprio SIE no quadro das suas atribuições e competências.
Pela lei, a única tarefa que o SIE pode desenvolver tem a ver com a materialização, em regime de exclusividade, da promoção e a pratica permanente da política e estratégia geral do Estado Angolano, relativa à pesquisa de informações de inteligência e de segurança.
Só muito dificilmente Miala conseguirá convencer os seus inquiridores de que a “Criança Futuro” era, do ponto de vista estratégico, uma boa base de trabalho para o SIE. Acusado que já está, de ter violado gravemente as normas de trabalho e de disciplina da instituição, Fernando Miala só por um verdadeiro milagre conseguirá dar a volta por cima à situação criada. Agora sim, pode-se dizer, que o General está a movimentar-se num labirinto, cuja porta de saída já está à vista de todos.
Para além de ter tentado popularizar uma bófia carrancuda, tornando-a mais simpática e menos ameaçadora aos olhos dos cidadãos, Miala conseguiu arrancar alguns elogios junto de anteriores inimigos que viram no seu desempenho um humanismo pouco praticado pelos seus colegas de topo.
Como se torna evidente, estivemos até aqui a navegar apenas pela superfície de um dossier que está longe de se esgotar nestas modestas pinceladas. Há muito mais caixa, como diria o publicitário…
Em Agosto do ano passado interrogamo-nos nestas colunas se tinham alguma consistência os rumores que circulavam sobre uma iminente vassourada (com a consequente reestruturação) nas altas esferas do aparelho securitário…
A resposta que encontramos na altura foi a seguinte: De facto a dica anda por aí a circular com alguma insistência. A confirmar-se uma tal remodelação, ela vai, certamente, provocar rombos em cascos até agora demasiado seguros do seu nariz, a provar que por aqui, o seguro morreu de velho, embora possa ter o rosto de um criança com muito futuro. Coisas da vida.